sexta-feira, 30 de novembro de 2007

ATUALIDADE DE CAMÕES

Em minha pré-adolescência, precisamente, na terceira série do curso ginasial no Colégio Arquidiocesano de Ouro Preto, o que hoje equivale a sétima série do primeiro grau, estudávamos com o nosso saudoso e amigo Cônego Mendes,( Padre Mendes). Lembro do seu esforço para por em nossas cabeças, o tão famoso poema de Camões, Os Lusíadas. E, como se não bastasse, tínhamos que decorar e fazer análise sintática das oitavas e sonetos.
Muito tempo se passou, Camões, foi ficando cada vez mais longe da minha vida. Também corri mundo, ainda jovem fui morar no Peru, só para conhecer os Incas, um belo povo pré-colombiano. Morei em Cuzco por quase um ano. Lá ficava pensando no mundo e no Brasil. Todo povo tem sua história, sua arte, seus rituais. Mas os rituais dos Incas foram proibidos, eles perderam a guerra contra os espanhóis. Tiveram que aceitar tudo que o ocidente achava que era a verdade.
Portugal também já foi uma colônia romana, existem muitas construções que ainda testemunham, e em Évora, encontramos o Templo de Diana, um dos mais bem conservado da Europa. Lisbona um porto no Tejo, cidade romana, foi de lá que saiu a Armada para a Índia, com Vasco da Gama à frente, pondo fim ao mais audacioso projeto, até hoje, feito por um povo: chegar às Índias por Mar. Quase um século de pesquisa, anos de luta, muita diplomacia, força e coragem para enfrentar um mar bravo e desconhecido.
Os Lusíadas é a narrativa desta viagem. Confesso que é muito difícil de se ler. Não por que esteja escrito em português antigo, mas por causa da nossa ignorância. Para escrever Os Lusíadas, Camões, estudou tudo que havia sido escrito antes: os gregos, os romanos e os árabes. Conhecia a história de seu país, da sua região espanhola, em detalhes. Os Lusíadas é um tesouro sem fim. Como navegador e curioso, descreveu pela primeira vez, locais, relacionando com outros, para mais fácil serem achados e entendidos, aulas de Homero.
Pois bem, como um menino poderia aprender tanto conhecimento, em apenas dois semestres? Não é possível, mas a importância de se ler Camões na escola, colocando dificuldade para que o aluno se abstraia, é um presente, pois, em poucas ocasiões, de nossas vidas, vamos ter a oportunidade de tomarmos contato com este Clássico da língua portuguesa. E se por acaso tivermos, não sentiremos a emoção de ter lido na juventude algo de valor.
Anos se passaram e estava eu de regresso a Portugal, pois, sinto na alma, a pátria lusitana, sem esquecer dos meus irmãos tupiniquins e africanos. Fui a Leon vi os Túmulos dos reis que deram origem a Portugal. Não podia deixar de ficar próximo, na capela de Santa Cruz em Coimbra, lado a lado, na capela mor, Afonso Henriques e seu filho Sancho. Sancho vem do latim e significa santo. Lendo Os Lusíadas, tudo isto está lá.
A emoção aumenta quando se chega na praia do Restelo, e se vê a Torre de Belém e dela o convento dos Jerônimos, uma construção quinhentista, onde D. Manuel deixou sua marca, arquitetura em mármore branco, lembrando lençol retorcido. Dentro, se encontram os restos mortais da família de D.Manuel, Alexandre Herculano, Fernando Pessoa, e, lado a lado, na entrada da nave, Camões e Vasco da Gama. Os restos mortais, daquele se perderam no terremoto de Lisboa, seu túmulo, outrora na Capela de Santana, sumiu, mas tudo se fez para transportar, junto com outros ossos, os seus restos. Pouco importa, lá está a sua figura imortal em mármore, do lado do mar, onde passou momentos de vida e morte, para nos deixar, esta grande obra, orgulho da língua portuguesa.
E o menino continua sua viagem, enfrentando os desafios, que a vida lhe oferece.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

TRINTA ANOS DE FESTIVAIS DE INVERNO

Os primeiros Festivais de Inverno trouxeram para o Brasil um ar de contemporaneidade. Vivíamos afastados das propostas mundiais apresentadas, somente, nas Bienais de São Paulo ou nos teatros do Rio de Janeiro. Ouro Preto foi a cidade que fomentou a possibilidade de outros festivais pelo Brasil. A magia da cidade, o clima maravilhoso, a beleza da paisagem e a educação da população propiciaram a realização de grandes encontros criativos, que resultaram na formação de artistas, que influíram no panorama nacional do século XX. Os Festivais de Inverno Ouro Preto foram tão importante para a capital do Estado, Belo Horizonte, que foi daqui que saíram os grupos de danças e teatros que ainda hoje ostentam a marca de uma arte de raízes e criatividade. Também, foi daqui que saíram os pratos típicos da cozinha mineira, pois na Capital se impunham as cantinas com as suas macarronadas.
O retorno ou descoberta de Ouro Preto pelos mineiros, foi sem dúvida alguma responsabilidade dos festivais. Não houve outro momento em Minas onde as pessoas tivessem tantas oportunidades de travar contatos entre si. Gente de todos os lugares do Brasil, aqui, se encontravam, trocando experiências. Mesmo num período difícil da ditadura militar, onde a repressão foi duramente imposta, acontecia, lado a lado, a maior concentração de hippies vivendo uma era de paz e amor.
Nas praças, artistas e artesãos vendiam suas obras. Nas galerias improvisadas, os alunos de Guignard mostravam o que o mestre lhes havia ensinado. Eram os professores de arte dos festivais. Também da Argentina, Uruguai, Bolívia, Equador, Peru, Colômbia, México e USA chegavam pessoas que se apresentavam nas ruas ou nos porões improvisados em boites, ficando na cidade o som típico das flautas de bambu.
A noite fria propiciava o consumo de bebidas e, a mais famosa, era a batida de limão, com o tira gosto de amendoim torrado. Cantava-se muito ao som de violão, Caetano, Chico e Gil. Às tardes, mostras de filmes brasileiros e autores internacionais, que não eram exibidos nos cinemas. Consertos de orquestras de câmara, músicas experimentais e pesquisas de instrumentos. No canto da Praça Tiradentes o cheiro do melhor café, alegrava a população que concorria para ver as novidades que aconteciam a cada instante.
Mas os festivais ganharam fama e atraíram multidões despreparadas, que achavam que Ouro Preto era uma cidade livre e se podia fazer de tudo. A cidade foi invadida, as ruas ficaram cheias de gente, bebendo e gritando, urinando pelas ruas, os forasteiros não sabiam o que estavam fazendo por aqui. Ônibus chegavam e já desciam jovens tocando instrumentos barulhentos e muitas vezes, gritando: galo ou cruzeiro. A fama de Ouro Preto como cidade livre, trouxe muitas pessoas sem educação e despreparadas, para o convívio com a arte e, assim destruíram os festivais. A cidade não mais queria ouvir falar esta palavra, até que por fim, terminou. Chegava-se o mês de julho mas não chegava o Festival de Inverno. Outras cidades assumiram os festivais, deixando por aqui: a bagunça, a bebedeira, a baderna.
A cidade sabe da importância do Festival de Inverno, e se tentou de várias formas, encontrar, um caráter que fosse a cara do festival. Com os festivais, vêm também os turistas que, de acordo com o clima, atraem determinado público. Outros festivais existem neste mesmo mês em todo o Brasil, cada um vai buscando a sua identidade, música, teatro, cinema, literatura, artes plásticas, gastronomia etc. O Festival de Inverno de Ouro Preto, tem na sua população a saída para qual rumo seguir. É, para seus habitantes, a alegria do mês de julho e são para seus jovens, trocas de conhecimentos. O festival é uma oportunidade de se educar com arte, refinar o cidadão com música e teatro, mostrar um mundo melhor, sem preconceito, oferecendo possibilidades, de se mostrar e ver o outro.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007